Dispõe sobre o plano municipal de atenção à população em situação de rua. [Em relação ao atendimento à saúde, determina; E) fortalecimento das ações de atenção à saúde mental das pessoas em situação de rua, em especial aqueles com transtornos decorrentes do uso de álcool e outras drogas, facilitando a localização e o acesso aos centros de atendimento psicossocial (caps);]
LEI Nº 9778, DE 29 DE MARÇO DE 2016
Dispõe sobre o Plano Municipal de Atenção à População em Situação de Rua.
A CÂMARA MUNICIPAL DE GOIÂNIA, Estado de Goiás, aprova e eu, PREFEITO MUNICIPAL, sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º O Poder Público Municipal manterá serviços e programas de atenção à População em Situação de Rua, garantindo padrões éticos de dignidade e não violência na concretização de mínimos sociais e dos seus direitos de cidadania, em observância aos princípios da Constituição Federal, o previsto no art. 23, § 2º, inciso II, da Lei Federal nº 8742, de 7 dezembro de 1993, com alterações pela Lei Federal nº 12.435, de 06 de julho de 2011 (Lei Orgânica da Assistência Social) e art. 34, inciso VII, da Lei Complementar 276, de 03 de junho de 2015.
§ 1º Os serviços e programas de atenção que trata o caput deste artigo, exige a instalação e a manutenção com padrões de qualidade, de uma rede de serviços sócio assistenciais e programas de caráter público direcionados à População em Situação de Rua que incluam ações preventivas, emergenciais e de caráter promocional, em regime permanente.
§ 2º As ações municipais terão caráter intersetorial de modo a garantir a unidade da política de trabalho desenvolvida pelos órgãos municipais para atenção à População em Situação de Rua.
Art. 2º Considera-se População em Situação de Rua, para os fins desta Lei, o grupo populacional heterogêneo, que possui em comum a pobreza extrema, os vínculos familiares rompidos ou fragilizados e a inexistência de moradia convencional regular, e que utiliza os logradouros públicos e as áreas degradadas como espaço de moradia e de sustento, de forma temporária ou permanente, e as unidades de acolhimento para pernoite temporário ou como moradia provisória, em consonância com o disposto no Parágrafo único, do art. 1º do Decreto Federal nº 7.053 de 23 de dezembro de 2009.
Art. 3º Os serviços e programas direcionados à População em Situação de Rua no âmbito municipal serão operados através da rede pública de serviços sócio assistenciais e/ou por contratos e convênios de prestação de serviços com associações civis de assistência social, regularmente cadastradas no Conselho Municipal de Assistência Social.
§ 1º Os convênios com associações civis sem fins lucrativos e a rede pública municipal têm como característica a complementariedade na prestação de serviços à População em Situação de Rua e o caráter público do atendimento.
§ 2º O funcionamento dos serviços e programas direcionados à População em Situação de Rua implica em múltiplas formas de parceria entre o Poder Público Municipal e as organizações da sociedade civil sem fins lucrativos, possibilitando o uso de áreas, equipamentos, instalações, serviços e pessoal de forma complementar, visando melhor efetivar a Política de Atenção à População em Situação de Rua.
§ 3º O Poder Público Municipal, enquanto não possuir rede própria para o atendimento integral à totalidade da População em Situação de Rua, garantirá o efetivo cumprimento dos direitos e garantias assegurados nesta Lei, por meio de entidades e organizações de assistência social, vinculadas ao Sistema Único de Assistência Social (SUAS) nos termos do art. 6º B, da Lei nº 8742/1993, garantindo-se o aporte necessário de recursos financeiros, humanos e materiais, observadas as disponibilidades orçamentárias.
§ 4º A implementação das ações sócio assistenciais no âmbito do Município, ocorrerá em consonância com a Política Nacional para a População em Situação de Rua, com fiscalização e monitoramento do Poder Público Municipal e conselhos de direitos.
Art. 4º A atenção à População em Situação de Rua no âmbito do Município, observará, além dos princípios da igualdade e equidade:
I - o respeito e a garantia à dignidade de todo e qualquer ser humano;
II - o direito da pessoa a ter um espaço para se localizar e se referir no Município e um mínimo de privacidade, como condição inerente à sua sobrevivência, existência e cidadania;
III - a garantia da suspensão de todo e qualquer ato violento e de comprovação vexatória de necessidade;
IV - a não discriminação no acesso a quaisquer bens e serviços, principalmente os referentes à saúde, assistência social e segurança pública, não sendo permitido tratamento degradante ou humilhante;
V - o direito do cidadão de restabelecer sua dignidade, autonomia, bem como sua convivência familiar e comunitária;
VI - o exercício cidadão de restabelecer sua dignidade, autonomia, bem como sua conivência comunitária;
VII - o exercício cidadão de participação por meio de organização representativas, na proposição e no controle das ações que lhes dizem respeito;
VIII - a integração das políticas públicas e dos esforços do poder público e da sociedade civil.
Art. 5º O Plano Municipal de Atenção à População em Situação de Rua compreende a implantação e manutenção pelo Poder Público Municipal a curto, médio e longo prazos, dos seguintes serviços e programas, observadas as disponibilidades orçamentárias:
I - Centros de Referência Especializada para a População em Situação de Rua - Centro POP, nos moldes do Decreto Federal nº 7053 de 23 de dezembro de 2009 e na Resolução nº 109/2009 do Conselho Nacional de Assistência Social, funcionando nos dias úteis, 8 (oito) horas diárias, com possibilidade de atuar em feriados, finais de semana e no período noturno, sendo a porta de entrada e encaminhamento para a prestação de serviços destinados à População em Situação de Rua, com equipe multidisciplinar adequada ao cumprimento de sua finalidade institucional, assegurando que:
a) os Centros POP contarão com materiais e apoio logístico para manter endereço postal comunitário, telefones públicos, mural informativo de outros serviços, locais para atendimento à saúde, prestação de serviços jurídicos e outros, além de secretaria para obtenção e guarda de documentos;
b) os Centros POP possuirão recursos humanos e materiais de forma a promover a convivência, a socialização e a organização grupal, atividades ocupacionais, educacionais, culturais e de lazer, bem como oferecer condições de higiene pessoal, de encaminhamento à Rede de Atenção à Saúde, além do direito humano à alimentação adequada, guarda de volumes e serviços de guarda de "carrinhos", quando for o caso;
II - programas assistenciais e preventivos realizados nas ruas através de uma equipe multiprofissional capacitada, com metodologia própria ao trabalho com a População em Situação de Rua;
III - serviços de acolhimento institucional, próprios ou conveniados, com provisão de instalações, recursos humanos e materiais necessários para acolhida e alojamento temporário de pessoas em situação de rua, fornecendo condições para higiene pessoal, alimentação, guarda de volumes e outros;
IV - serviços de acolhimento institucional, próprios ou conveniados, que atendam pessoas em situação de rua com doenças infectocontagiosas;
V - moradias provisórias, próprias ou locadas, com capacidade de uso temporário por até 15 (quinze) pessoas em situação de rua ou em processo de reinserção social;
VI - rede informatizada entre os serviços de acolhimento institucional com controle de vagas, perfil dos acolhidos, encaminhamentos, soluções, medidas e providências adotadas;
VII - canais de comunicação para o recebimento de denúncias de violência contra a População em Situação de Rua, bem como de sugestões para o aperfeiçoamento e melhoria das políticas públicas voltadas para este segmento;
VIII - serviços e centros de referência especializados de políticas públicas de saúde, educação, previdência e assistência social, moradia, segurança, cultura, esporte e lazer, trabalho e renda;
IX - restaurantes comunitários específicos, com provisão de instalações localizadas em locais estratégicos preparados com recursos humanos e materiais para oferta gratuita de alimentos à População em Situação de Rua ou criação de programa de segurança alimentar e nutricional, que garanta esse mesmo direito por meio de entidades ou unidades que possam prestar o referido serviço;
X - capacitação e o treinamento dos servidores municipais que operam os serviços de abordagem, atenção e amparo;
XI - ações educativas destinadas à superação do preconceito e para a melhoria da qualidade e respeito na atenção deste grupo populacional.
Art. 6º Compreendem ações setoriais de atenção à População em Situação de Rua a serem desenvolvidas pelos órgãos municipais responsáveis pelas políticas públicas relativas às seguintes áreas:
I - Habitação:
a) soluções habitacionais definitivas com oferta de alternativas habitacionais que atendam pessoas em processos de reinserção social e incluam auxílio moradia e financiamento de construções em regime de mutirão e o aluguel social;
b) adoção pelo órgão municipal responsável pela execução da política habitacional do Município, da condição de "Situação de Rua", como critério adicional para prioridade de vagas em conjuntos habitacionais do Programa Minha Casa Minha Vida, nos termos do que dispõe o item 4.23, "b", da Portaria nº 595/2013 do Ministério das Cidades;
II - Trabalho:
a) oficinas, cooperativas de trabalho e comunidades produtivas com provisão de instalações preparadas com equipamentos, recursos humanos e materiais para: regate da cidadania através dos direitos básicos ao trabalho; capacitação profissional; encaminhamento à postos de trabalho; apoio a formação de associação e cooperativas de produção e geração de renda; manutenção de projetos agrícolas de desenvolvimento auto sustentável que promovam a autonomia e a reinserção social da População em Situação de Rua;
III - Educação:
a) garantia de vagas na rede pública de ensino, municipal, de preferência em escolas em tempo integral, para crianças e adolescente egressas ou ainda em situação de rua, com a disponibilização de uniformes, materiais escolares, e passe livre no transporte público, com o respectivo acompanhamento social dessas famílias;
b) prioridade na inserção da população em situação de rua nas unidades educacionais da Rede Municipal de Ensino, no Programa de Educação de Adolescentes, Jovens, e Adultos, com previsão de material pedagógico e vale transporte ou passe livre;
IV - Segurança Pública:
a) garantia da capacitação dos operadores de direitos do Poder Público Municipal quanto aos direitos humanos, principalmente àqueles concernentes à População em Situação de Rua, incluindo nos cursos de formação conteúdo sobre o tema, para implantação de uma política de segurança comunitária, para atuar na defesa e proteção dessa população;
b) fortalecimento do serviço de ouvidoria para receber denúncias de violações de Direitos Humanos em geral, e especialmente dos direitos da População em Situação de Rua;
c) oferta de assistência jurídica e disponibilização de mecanismos de acesso a direitos, incluindo documentos básicos às pessoas em situação de rua, em parceria com os órgãos de defesa de direitos;
V - Direitos Humanos:
a) atuação pelo respeito à dignidade do ser humano e na promoção dos direitos civis, políticos, sociais, econômicos, culturais e ambientais, conforme o Plano Nacional de Direitos Humanos;
b) atuação pela não discriminação por motivo de gênero, orientação sexual, origem étnica ou social, nacionalidade, atuação profissional, religião, deficiência, faixa etária e situação migratória, na perspectiva da superação do racismo, geracional, da homolesbotransfobia, machismo, das desigualdades sociais, na defesa do Estado laico e valorização às diferenças;
c) supressão de todo e qualquer ato violento e ação vexatória, inclusive os estigmas negativos e preconceitos sociais em relação à População em Situação de Rua;
VI - Saúde:
a) garantia do fluxo e protocolo intersetorial de organização da atenção social e de saúde para a População em Situação de Rua no âmbito do SUAS e do Sistema Único de Saúde (SUS), nos termos da Portaria nº 77/2014, do Secretário Municipal de Saúde, publicada em 1º de outubro de 2014 no Diário Oficial do Município Eletrônico, ou outra que venha modificar ou alterar seu conteúdo, visando facilitar o acesso deste segmento às políticas, ações e serviços públicos;
b) garantia da atenção integral à saúde das pessoas em Situação de Rua e adequação das ações e serviços existentes, assegurando a equidade e o acesso universal no âmbito do SUS, com dispositivos de cuidados interdisciplinares e multiprofissionais;
c) fortalecimento das ações de promoção, prevenção, tratamento e reabilitação em saúde, com ênfase nas equipes de atenção básica para as populações específicas através das equipes do Consultório na Rua, incluindo prevenção e tratamento de doenças com maior incidência junto à População em Situação de Rua;
d) definição dos critérios para o atendimento à saúde da População em Situação de Rua pela Secretaria Municipal de Saúde;
e) fortalecimento das ações de atenção à saúde mental das pessoas em situação de rua, em especial aqueles com transtornos decorrentes do uso de álcool e outras drogas, facilitando a localização e o acesso aos Centros de Atendimento Psicossocial (CAPS);
f) inclusão no processo de educação permanente em saúde dos gestores e trabalhadores de saúde, destacando-se as equipes do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), dos conteúdos relacionados às necessidades, demandas e especificidades da População em Situação de Rua;
g) incentivo à produção de conhecimento sobre a temática saúde da População em Situação de Rua e os mecanismos de informação e comunicação.
VII - Cultura:
a) promoção de amplo acesso aos meios de informação, criação, difusão e fruição cultural para a População em Situação de Rua;
b) desenvolvimento da potencialidade da linguagem artística como fundamental no processo de reintegração social das pessoas em situação de rua, mediante a promoção de atividades artísticas especificamente voltadas para esta população, tais como aulas e prática de teatro, literatura e artesanato;
c) promoção de ações e debates de ressignificação da rua, deixando de retratá-la como um simples lugar de passagem e passando a percebê-la como palco de encontros, diálogos e construção de identidades;
d) apoio às ações que tenham a cultura como forma de inserção social e construção da cidadania;
e) apoio às ações que promovam a geração de ocupação e renda através de atividades culturais;
f) promoção de ações de conscientização que alterem a forma de conceber as pessoas em situação de rua, desconstruindo estigmas e promovendo ressignificações positivas;
g) garantia de programas voltados para o esporte e o lazer da população em situação de rua;
h) incentivo a projetos culturais que tratem de temas presentes na realidade de quem vive nas ruas, além do financiamento de projetos voltados para esse público, seja em seu desenvolvimento artísticos e cultural, seja para facilitação de seu acesso aos bens culturais disponíveis na sociedade.
Art. 7º O Chefe do Poder Executivo deverá criar Comitê Intersetorial de Políticas para Pessoas em Situação de Rua, com a missão de acompanhar a implementação do Plano de Atenção à População em Situação de Rua de Goiânia e integrar as ações dos órgãos municipais envolvidos, mantendo em sua estrutura um fórum permanente para discussão e deliberação das ações necessárias para o atendimento à população em situação de rua do município.
§ 1º Poderão compor este Fórum além dos órgãos municipais envolvidos, representantes do Poder Legislativo Municipal, integrantes do Ministério Público e da Defensoria Pública, instituições e associações que interagem na atenção à população em situação de rua e representantes desta população.
§ 2º A coordenação e o suporte técnico e operacional do Comitê será de responsabilidade da Secretaria Municipal de Assistência Social, em conjunto com a Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Políticas Afirmativas.
Art. 8º A lei orçamentária anual deverá conter dotações específicas para a implementação do Plano instituído por esta Lei, em especial nos seguintes órgãos/entidades municipais: Secretaria Municipal de Assistência Social, Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, Trabalho, Ciência e Tecnologia, Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação, Secretaria Municipal de Educação e Esporte, Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Políticas Afirmativas, Secretaria Municipal de Saúde, Secretaria Municipal de Cultura e Agência da Guarda Civil Metropolitana.
Art. 9º O Chefe do Poder Executivo deverá publicar anualmente no Diário Oficial do Município o Censo da População de Rua de Goiânia.
Art. 10 Esta Lei será regulamentada no que couber pelo Chefe do Poder Executivo, ficando revogado o Decreto nº 2585, de 17 de abril de 2013.
Art. 11 Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação.
GABINETE DO PREFEITO DE GOIÂNIA, aos 29 dias do mês de março de 2016.
PAULO GARCIA
Prefeito de Goiânia
Osmar de Lima Magalhães
(Publicado no DOM Eletrônico Edição 6294, de 30.03.2016, págs. 19 e 24 de 59)
Nota: Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial.
Data de Inserção no Sistema Leis Municipais: 27/07/2016